Ah, o primeiro amor…

primeiro amor
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Primeiro amor

No início, entre meninos e meninas existe uma relação de conflitos e indiferença. Passados alguns anos, conseguem conviver harmoniosamente e, ao brincarem juntos, nutrem um sentimento de querer-bem. Talvez até amor.

Como na infância ocorre um treino para o mundo adulto, não é de se estranhar que as crianças vivenciem amor para com seus colegas do sexo oposto. Porém, são necessários alguns cuidados para que elas não antecipem uma fase do desenvolvimento e, assim, deixem de viver plenamente a meninice.

No cotidiano clínico, verifica-se a presença de namoricos desde a mais tenra idade. Algumas vezes, o motivo da consulta é relacionado justamente a isso: os pais encontram dificuldades em abordar a questão; ou há repercussões negativas no desempenho acadêmico por falta de concentração nos estudos.

Geralmente, o contexto em que se aflora o interesse pelo colega é a própria escola, espaço de socialização mais significativo para crianças e adolescentes. Não existe uma faixa etária definida para as primeiras manifestações amorosas. Mas sabe-se de algumas variáveis que influenciam o seu aparecimento. Mais uma vez, é o ambiente que interfere de forma mais expressiva.

Os adultos mais próximos da criança normalmente especulam sobre a existência de namoricos em crianças pré-escolares. Geralmente quando verificam que o infante demonstra satisfação em interagir com uma criança do sexo oposto.

Verifica-se uma influência maior quando se trata de meninos, pois é uma prática cultural modelar o comportamento galanteador desde cedo. Caso haja uma supervalorização disso, a família pode ensinar à criança que se espera dela um par, incentivando-a para essa busca, que não ocorrerá de forma natural.

A influência do modelo familiar 

Além disso, existe a influência do próprio modelo familiar. Pois a criança observa as manifestações de carinho dos pais, associa como algo que é socialmente esperado. E, pela infância ser um treino para as fases que vão se suceder, a criança reproduz relacionamentos afetivos nas brincadeiras e também com os colegas do sexo oposto com quem se identificam.

Comumente, em crianças pré-escolares, o “namoradinho” é aquele amigo com quem a criança gosta de brincar, com quem sente um carinho especial e, por isso, possui caráter de fantasia. Para elas, o namorico funciona mais como uma brincadeira, o melhor amigo, o preferido para conversar e ficar por perto.

Nesse treino afetivo, em crianças menores observa-se sentimentos de ciúmes do carinho estabelecido entre os pais. Um exemplo disso é quando eles se alcunham de “namorada do papai” ou “namorado da mamãe”.  Justifica-se esse comportamento pelo fato de que eles ainda estão assimilando papeis sociais e sexuais, além do que experimentam a modalidade mais pura do amor, direcionando-a para aqueles que oferecem esse sentimento incondicionalmente.

Mesmo que seja bonitinha essa declaração, é importante que os pais estabeleçam as diferenças dos papeis familiares, colocando a criança no seu papel de filho, não de namorado. Os pais, estes sim, são namorados um do outro.

Embora haja sentimentos de amor entre filho e mãe (ou pai e filha), os papeis não se confundem, o amor é diferente. Por ser assim, permitem comportamentos bem distintos e é importante delimitar isso para a criança.

Crianças e o primeiro amor

Na fase escolar, entre 6 e 10 anos especificamente, diante da revelação de que a criança está gostando de alguém ou que tem namorado (a), é importante que se explore o que ela quer dizer com esses termos: gostar de alguém é querer passar mais tempo juntos brincando, ou significa alguma outra coisa, como querer beijar na boca? Usualmente, o amar infantil envolve o prazer da companhia, que provoca uma vontade de querer estar perto do outro. Faz parte da infância a fantasia, nada mais natural.

No entanto, é recomendado que os adultos, sem conotação punitiva, estabeleçam com as crianças os limites desse namoro. Por exemplo, recomenda-se que os pais sejam empáticos e compreensivos, respeitando o sigilo quanto ao fato. Mas que estabeleçam limites que julgam saudáveis e pertinentes quanto a esse namoro na faixa etária em que ele se apresenta.

Distinguir diferenças entre o gostar de uma criança e o namoro de adulto é uma sugestão. Pois, assim a criança assimilaria que é natural gostar de alguém, mas que, namorar de verdade, apenas é permitido aos adultos. Não se deve proibir o namoro. Porém, deve-se ter cuidado para não modelar um comportamento que é alheio à infância, adiantando uma fase do seu desenvolvimento.

Normalmente, as crianças revelam seus segredos em algum esconderijo. Ao invés de bisbilhotarem, pais devem apresentar-se desde cedo como adultos confiáveis e abertos ao diálogo.

Assim, naturalmente eles cogitarão a possibilidade de fazerem de seus pais ouvintes em potencial diante dos seus segredos.

Ademais, no decorrer do desenvolvimento, observa-se uma mudança gradual na maneira de gostar das crianças: o platonismo da pré-escola evolui para a busca pelo namoro propriamente dito na puberdade, tornando-se mais expressiva em torno dos 11 anos.

Adolescentes e o primeiro amor

A partir dos 10 anos é comum fazerem brincadeiras entre amigos, como as que acidentalmente provocam toques corporais. Na puberdade e pré-adolescência, já estabelecem um contato mais próximo: abraçam e beijam, andam de mãos dadas e podem trocar votos de amor. Consiste em um avanço, portanto, quanto à etapa anterior.

A partir da puberdade, também é comum haver também vários objetos de amor. Ou seja, não gostarem apenas de um colega, mas de vários.

Após os 15 anos, os adolescentes comumente já pensam e desejam sexo. Caso namorem na adolescência, as orientações devem ser mais intensificadas. Com monitoria e orientações mais específicas, sobretudo quanto aos cuidados em relação ao outro.

Pelo fato de no namoro exercitar-se o amar e se sentir amado, importante e especial, há contribuições para a autoestima. No entanto, se o namoro interfere de forma negativa no desenvolvimento do jovem, cabe a abordagem dos pais quanto a isso.

Pais

Outra questão pertinente a ser relatada diz respeito à própria vivência dos pais. A referência de infância é aquela que eles viveram que, temporalmente, não condiz com a dos filhos. Os valores podem ser passados de uma geração para outra, propiciando a aprendizagem de padrões através da transmissão intergeracional. Porém é importante respeitar as características da geração em questão. No momento da orientação parental, é importante que os pais lembrem-se disso.

Muitas vezes a constatação da sexualidade do filho propicia aos pais sentimento de perda e choque. É comum desejar que os jovens nunca cresçam por temerem quebras no vínculo.

No entanto, é necessário que estes se trabalhem emocionalmente para este momento, que é natural do desenvolvimento humano.

Verbalizações do tipo “nem quero saber quando estiver namorando” ou “eu vou botar para correr” fazem o jovem perceber que algo que julga importante é considerado aversivo para os pais. O que favorece sentimentos de culpa, ansiedade e uma série de comportamentos indesejáveis.

Considerando a idiossincrasia do desenvolvimento humano, verifica-se, portanto, a dificuldade de se estabelecer uma idade certa para começar a namorar. No entanto, é fato que se quisermos que a criança aja como tal, não podemos tratá-la como adulto em miniatura. Pois excessos nesse sentido pode permitir a antecipação da puberdade, o que já traria consequências negativas, como a erotização precoce.

Preparo emocional dos pais, diálogo, orientação e uma boa receptividade aos segredos e queixas dos jovens continuam sendo fatores fundamentais para o bom desenvolvimento da sexualidade infanto-juvenil. É isso mesmo: o primeiro amor espera a hora certa de chegar e os pais tem a difícil missão de colaborar para que ele seja, realmente, inesquecível.

Inpa – Instituto de Psicologia Aplicada, Asa Sul, Brasília – DF, Brasil

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