A roda do hamster
Há alguns dias, ouvi a analogia da roda do hamster com o estilo de vida repetitivo.
Estilo esse que é pouco consciente e que nos afasta cada vez mais dos nossos propósitos maiores.
Além disso, nos faz esquecer dos nossos princípios e valores.
Fiquei pensando no quão apropriada era aquela comparação e no quanto giramos, giramos e giramos a “roda da vida” sem percebermos que não saímos do lugar.
Para alguns, a roda é a preparação para passar no tão sonhado concurso público, para outros o trabalho que extrapola oito, dez, doze horas diárias.
Para outros, a busca desmedida pela prosperidade financeira ou a procura incessante, hedonista e efêmera pelas experiências sensoriais.
Não questiono o valor de horas a mais no trabalho prazeroso; não posso jamais criticar o comportamento de seguir os princípios de uma educação financeira; muito menos aponto o prazer de saborear um bom vinho ou de ter uma deliciosa noite de amor como práticas disfuncionais.
Contudo, devo concordar que a vida baseada numa só fonte de satisfação ou baseada em esquemas de gratificação de curto prazo podem sinalizar a roda do “homo-hamster” da atualidade.
Girando, girando a nossa “rodinha” vamos acumulando dinheiro e para os fins que consideramos ser as grandes importâncias da nossa vida.
Compramos o nosso SUV prata novinho. Enforcamo-nos em meio as prestações mensais e anuais do nosso incrivelmente pequeno apartamento no Setor Noroeste e fazemos tudo isso certos de que estamos no caminho.
Afinal, o estilo de vida repetitivo que traça o caminho certo?
Mas, no caminho de quê mesmo?
Não, não sabemos. Não sabemos porque simplesmente aprendemos a fazer isso.
Trabalhar, juntar dinheiro e, com isso, apresentar aos nossos familiares e amigos os troféus adquiridos a custa de pouco ou muito suor.
Suor no sentido figurado, embora estejamos falando da roda do hamster. Sim, fazemos parte de uma classe média em ascensão. Temos entre vinte e quarenta e poucos anos e queremos os nossos troféus.
Não importa o quanto café tenhamos que beber, quanta ritalina tenhamos que consumir. Ou quanto prejudicamos o nosso sono ou momento de descanso.
Aliás, descanso? – Não, não podemos! Temos que girar a rodinha.
Mas, por que giramos a rodinha?
Porque estamos a pouco de conseguir financiar o nosso novo carro com os imprescindíveis bancos de couro, freios com ABS/EBD e air-bag duplo para o motorista e passageiro.
Sim, somos da classe média e temos que mostrar que estamos em ascensão. E vamos programar o próximo MBA para aumentar a nossa visão de marcado.
Aliás, sigamos rumo ao próximo fim-de-semana sacrificado em função das aulas do cursinho preparatório para o concurso do Senado.
É assim mesmo, sem avaliarmos o custo emocional e o custo para a nossa saúde orgânica, psicológica e emocional, vamos girando a rodinha e nos enfiando cada vez mais na nossa gaiolinha.
Ah, e antes que gere confusão, essa gaiolinha não é metáfora para o apartamento que compramos na ainda na planta e que custa meio milhão de reais.
É metáfora para a nossa vida.
Cada vez mais cerceada pelas obrigações que estão em função daquilo que consideramos as grandes importâncias da nossa vida.
Afinal, foi esse estilo de vida repetitivo que garantiu sucesso ao seu primo, ao seu amigo ou aos seus pais.
Não são poucas as vezes em que paro e me pergunto: – De verdade, de coração, para quê?
Princípios? Valores? Propósitos maiores? O que seria isso, heim? Acho que nos esquecemos dos significados dessas palavras.
Inpa – Instituto de Psicologia Aplicada, Asa Sul, Brasília – DF, Brasil